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Representantes do Povo Munduruku
em ato de protesto na frente do Palácio do Planalto, 2013
As decisões referentes à Usina Hidrelétrica do Tapajós
também asseguram o direito à consulta das comunidades tradicionais afetadas pelo projeto. O Estudo de
Impacto Ambiental aponta que a obra irá afetar de
maneira grave o povo Munduruku e dezenas de comunidades tradicionais, como Montanha e Mangabal, São Luis e Pimental. O mesmo estudo,no entanto, adota a heteroidentificação e não reconhece São
Luis e Pimental como comunidades tradicionais37.
Por isso, as decisões judiciais reconheceram o direito
de estas comunidades tradicionais terem processos
específicos de consulta. Importante destacar que as
comunidades de Montanha e Mangabal tiveram a
ocupação tradicional do território reconhecida pelo
governo federal por meio da criação de um projeto
agroextrativista (PAE).
As próprias comunidades de Montanha e Mangabal
entendem que devem ser reconhecidas como sujeitos coletivos dos direitos estabelecidos na Convenção 169/OIT e, em exercício de sua autonomia, elaboraram e publicaram seu “Protocolo de Consulta”,
no qual reivindicam sua condição e estabelecem os
procedimentos que o governo deve respeitar para
desenvolver processos de consulta com eles:
“Porém, não se pode afirmar que são populações tradicionais
nos termos da Lei Nº 111.284 (Lei de Gestão de Florestas Públicas)...
ou como define o Decreto Nº 6.040, Art. 3º, Inciso 1, Povos e Comunidades Tradicionais...” (EIA, Vol. 7, pág. 120).
37
Nós não somos invisíveis e não abrimos mão
do nosso lugar. No passado, os grileiros diziam que ninguém vivia em Montanha e
Mangabal, mas lutamos e conseguimos que
nosso direito à terra fosse reconhecido. Agora, é o governo quem diz que não existimos
e planeja construir barragens no rio Tapajós
sem nem nos consultar. Mas sabemos que
a lei garante nosso direito à consulta prévia
e exigimos que ele seja cumprido. Aqui, neste beiradão, nós nascemos e nos criamos.
Pegamos malária, enfrentamos as cachoeiras,
cortamos seringa, caçamos gato, pescamos,
fizemos nossas roças. Foi assim nossa lida. À
beira do Tapajós, enterramos nossos pais e
nossos filhos.38
A mencionada UHE de São Luiz do Tapajós teve seu
licenciamento negado pelo órgão ambiental Federal
em agosto de 2016 devido à insuficiência técnica dos
estudos de impacto ambiental apresentados. Adicionalmente, a Funai manifestou-se pela inconstitucionalidade do projeto. Mesmo assim, o governo federal,
interessado no leilão do empreendimento, continua
ignorando o direito à consulta das comunidades tradicionais e não adotou qualquer medida para dar
início ao processo de diálogo. De fato, ao anunciar o
arquivamento do processo de licenciamento ambiental, representantes do estado brasileiro afirmaram ter
sido realizada consulta livre, prévia e informada com o
povo Munduruku39, fato duramente rechaçado pelos
indígenas. No final de 2014, em reunião com lideranças de Montanha e Mangabal, funcionários da então
Secretaria Geral da Presidência da República admitiram que o governo não consultaria as comunidades
tradicionais afetadas:
38
Íntegra do Protocolo está disponível em: http://www.consultaprevia.org/#!/documento/321
39
Relatório do Governo Brasileiro apresentado durante a 33a
Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em resposta ao
Relatório da Relatora Especial da ONU sobre os Direitos dos Povos
Indígenas sobre sua visita ao Brasil.