consulta sobre a própria viabilidade do projeto de
mineração, ou seja, sobre a licença prévia da obra.
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O órgão licenciador estadual autorizou o empreendimento e decidiu sobre sua viabilidade sem consultar os povos indígenas afetados, declarando que
a consulta será realizada antes da próxima fase do
licenciamento ambiental, que consiste na discussão
sobre o processo de instalação da mineradora, e não
mais sobre sua viabilidade. Isso faz com que a própria
consulta torne-se inócua quanto à garantia do direito
territorial dos povos indígenas e comunidades tradicionais duplamente impactados pela Usina de Belo
Monte e pela mineradora Belo Sun. Sem a oportunidade de influenciar qualquer das duas decisões, essa
prática provoca impactos irreversíveis para os povos
afetados e seus territórios.
Tal fato levou à decisão judicial em 2013 determinando a suspensão do licenciamento ambiental da
mineradora, que já entrava na fase de emissão de
licença prévia pelo órgão ambiental estadual, mas
em seguida foi revertida em favor da empresa canadense. Em 2016, ainda sem a realização de consultas,
o governo do Estado do Pará decidiu por adiar a autorização de funcionamento da mineração.
O caso do Projeto Belo Sun na Volta Grande é revelador da negligência dos governos em diversas instâncias (municípios, estados e união) que postergam
a consulta ao máximo, ao ponto de tentar torná-la
ineficaz. Também mostra que a indisposição dos governos em efetivarem o direito de consulta no seu
momento adequado (anterior à tomada de decisão)
gera um contexto de desconfiança e insatisfação
que impossibilitam diálogos, acordos e consensos.
Sobre esse caso a Relatora Especial da ONU sobre os
direitos dos povos indígenas recomendou ao Estado
brasileiro: “Considerando as alegações de etnocídio no
caso Belo Monte trazidas pelo Ministério Público, extrema cautela deveria ser exercida com relação à mineradora Belo Sun e o projeto de hidrelétrica Tapajós. Esses
projetos não deveriam ser considerados se existe potencial para impactos semelhantes ou se os povos indí-
genas afetados não manifestaram seu consentimento
livre prévio e informado após os estudos participativos
de impactos social, ambiental e de direitos humanos e
as consultas de boa-fé”.93
Sobre a oportunidade adequada para realizar processos de consulta prévia, no âmbito do licenciamento
ambiental, recentemente foi emitido precedente
judicial expressivo a respeito no Supremo Tribunal
de Justiça. No Agravo Regimental na Suspensão de
Liminar nº. 1745/PA, o Ministro Felix Fischer afirmou
que nenhuma licença ambiental pode ser concedida
antes de realizada a consulta livre, prévia e informada:
“para se dar fiel cumprimento aos dispositivos
da Convenção, o Governo Federal deverá promover a participação de todas as comunidades, sejam elas indígenas ou tribais, a teor do
art. 1º do texto convencional, que podem ser
afetadas com a implantação do empreendimento, não podendo ser concedida a licença
ambiental antes das suas oitivas”94.
É indispensável que durante o licenciamento ambiental, em especial antes da emissão de cada licença ambiental, seja realizada a consulta livre, prévia e
informada de forma a garantir a participação efetiva
de povos e comunidades afetadas. Participação esta
que deve ser direta, transversal e permanente ao processo de licenciamento ambiental e que precisa ser
renovada a cada nova decisão.
93
94
A/HRC/33/42/Add.1, para.99(b)
Agravo Regimental na Suspensão de Liminar nº. 1745/PA