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Modo
A Convenção 169/OIT deve ser compreendida a
partir de seu contexto internacional de reconhecimento formal da necessidade dos Estados superarem ideários assimilacionistas e de colonização
de povos culturalmente diferenciados. O direito à
consulta e consentimento pressupõe que as autoridades estatais sejam capazes de conversar, ouvir
e considerar a presença, os planos de vida e os direitos de populações culturalmente diferenciadas.
Esse direito não se confunde nem exclui o direito
de participação cidadã, resguardado por outros instrumentos e procedimentos de participação da sociedade civil, como audiências públicas e conselhos
paritários. Tais espaços costumam ser ambientes hostis à participação de povos indígenas, comunidades
quilombolas e tradicionais, pois com frequência não
respeitam as especificidades culturais de cada sujeito
coletivo (como a necessidade de tradução, formas
particulares de representação e deliberação, dentre
outros aspectos). A consulta prévia, diferentemente
disso, se propõe a garantir o diálogo intercultural.
Dessa maneira, o direito à CCPLI não deve ser transformado em instrumento para referendar decisões
governamentais, nem em um espaço burocrático
que inviabilize a participação efetiva dos sujeitos
interessados. Discutir o modo como deve ocorrer a
consulta é tão importante quanto discutir seus sujeitos, objetos e oportunidade. No próximo item, abordaremos três dimensões que ajudam a responder à
pergunta sobre como consultar, tratando especificamente de seu caráter “culturalmente apropriado”, “de
boa fé” e “livre”.
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Assembleia Geral do Povo Munduruku, Aldeia Restinga , 2013
Caráter culturalmente apropriado
A Convenção 169/OIT prevê que as consultas devem
ser realizadas “mediante procedimentos apropriados” e
por meio das “instituições representativas” dos sujeitos
interessados (artigo 6º). A Corte IDH fixou o entendimento de que os governos precisam garantir o caráter “culturalmente apropriado” das consultas, em conformidade “com os costumes e tradições” dos sujeitos
interessados, particularmente quanto aos seus métodos tradicionais de decisão95, cabendo aos próprios
sujeitos decidirem sobre sua forma de representação,
e não ao Estado.96
No já citado caso brasileiro de tentativa de regulamentação da consulta, verificamos que o artigo 8º da
minuta regulamentadora propõe que as consultas
serão dirigidas às instâncias colegiadas, às instituições representativas ou diretamente às comunidades
quilombolas, de acordo com a análise da Comissão
de Consulta Prévia (composta exclusivamente por
membros da Administração Pública) e pautando-se
Corte IDH. Saramaka vs. Suriname, op. cit., p. 42-43
Corte IDH. Caso del Pueblo Saramaka vs. Surinam. Sentencia Serie C Nº 185 del 12 de agosto de 2008 (Interpretación de la Sentencia de Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas), p.
2-3. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/
seriec_185_esp.pdf
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