No quadro da página anterior, reunimos as principais
propostas legislativas em tramitação que afetam os
sujeitos interessados, seus direitos territoriais e seu desenvolvimento sustentável, sem que conste qualquer
procedimento de consulta no processo legislativo.
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A maior parte dos projetos de lei e de emendas constitucionais supracitados representa a mais grave
ofensiva legislativa aos direitos de povos indígenas,
comunidades quilombolas e povos e comunidades
tradicionais desde a promulgação da Constituição
Federal de 1988, e responde ao crescente interesse público e privado em torno nos recursos naturais disponíveis nos seus territórios (construção
de hidrelétricas, hidrovias, projetos de mineração,
expansão da fronteira agropecuária etc.), sem considerar os direitos e os modos de vida destes grupos diferenciados. Mesmo nos casos dos projetos
que buscam regulamentar normas constitucionais,
observa-se que o objetivo é tão somente garantir
uma regulação favorável à exploração dos recursos
naturais, sem qualquer preocupação em resguardar
os direitos dos povos afetados, contrariando assim
o espírito dos direitos assegurados na Convenção
169/OIT e reafirmado em várias instâncias internacionais de direitos humanos, como a Comissão e
Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Entre as mencionadas iniciativas legislativas, vale a
pena destacar o Projeto de Lei nº. 1.610/96, que autoriza mineração em terras indígenas e a proposta de
Emenda Constitucional PEC nº. 215/2000.
O PL nº. 1.610/1996 representa grave ameaça aos
direitos territoriais dos povos indígenas, principalmente na região amazônica. Segundo levantamento realizado pelo Instituto Socioambiental em 2013,
existem 4.220 processos de requerimento minerário
incidentes em 152 Terras Indígenas na Amazônia Legal. Os processos de requerimento minerário superam 90% do território total de 32 Terras Indígenas e
mais de 50% em outras 74 terras indígenas.65 A definição das regras para a exploração minerária em
terras indígenas é um assunto que indiscutivelmente
deve ser consultado com todos os povos indígenas
do Brasil, observando-se as especificidades dos povos afetados. Não obstante, o Congresso Nacional
se nega a implementar um processo de CCPLI para
discutir o tema com aqueles diretamente afetados.
O relator do projeto de lei de mineração em terras indígenas, Deputado Édio Lopes (PMDB-RR),
manifestou, em julho de 2015, que a consulta prévia sobre essa matéria já teria sido realizada com
os povos indígenas de todo o país no contexto
de debate e consulta sobre o Projeto de Lei nº.
2.057/1991, que inclui disposições sobre mineração em terras indígenas. Segundo o Deputado, o
debate realizado pela Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) sobre o Projeto de Lei que
trata do novo “Estatuto das Sociedades Indígenas
do Brasil” (PL nº .2.057/1991) esgotou a consulta
necessária sobre o tema.66
Transportar posicionamentos e opiniões dos povos
indígenas de um projeto de lei para outro, como se
fossem situações equivalentes, constitui inegável
intenção de enganar aqueles que de boa fé participaram dos processos de consulta convocados sobre
o PL nº. 2.057/1991. E este último é de uma iniciativa
que pretende atualizar e harmonizar a legislação indigenista vigente no Brasil com o marco constitucional de 1988. Apesar da notória necessidade de
sua aprovação, há mais de 20 anos que o referido PL
permanece parado no Congresso Nacional.67
Outra iniciativa de significativo impacto nos direitos
indígenas e de populações tradicionais que atual65
Íntegra do estudo disponível em: https://www.socioambiental.org/sites/blog.socioambiental.org/files/publicacoes/mineracao2013_v6.pdf
66
Íntegra da entrevista disponível em: http://www.socioambiental.org/pt-br/noticias-socioambientais/relator-de-mineracao-em-terra-indigena-vai-reapresentar-parecer-e-diz-que-consulta-ja-foi-feita.
67
A tramitação legislativa do PL nº 2057/1991 está disponível em:
<http://www2.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=17569>.