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de cosméticos, fármacos, limpeza, química e do agronegócio interessadas na regulamentação (usuárias do
patrimônio genético e do conhecimento tradicional
associado) por um lado, e os povos indígenas, comunidades quilombolas, povos e comunidades tradicionais (provedores do conhecimento tradicional sobre o
patrimônio genético) por outro.
postas escritas dos futuros Decretos regulamentares da
nova Lei, assim como a realização de seis oficinas regionais, uma oficina nacional, além de uma audiência pública nacional. Não obstante, nenhuma minuta de Decreto
ou qualquer outra proposta foi apresentada, impedindo
por completo a participação e a consulta na construção
de dita regulamentação durante a fase consultiva.
O resultado do processo de tramitação legislativa, sem
a CCLPI, foi um texto normativo desfavorável aos detentores dos conhecimentos tradicionais: prevê repartição
de benefícios em hipóteses restritas e sem garantia aos
sujeitos interessados no controle sobre seu próprio
conhecimento tradicional.61As manifestações62 sobre a
falta de participação e consulta dos sujeitos interessados na elaboração da lei não impediram que esta fosse
aprovada e encaminhada para sanção presidencial.
Todas as oficinas regionais foram realizadas sem que
antes tivesse sido apresentada qualquer proposta
concreta de regulamentação, o que limitou tanto a
informação quanto a necessária participação e consulta dos detentores de conhecimentos tradicionais.
Tais fatos, aliás, foram registrados em cartas públicas
redigidas por indígenas, quilombolas e comunidades
tradicionais em cada uma das seis oficinas regionais.
A nova Lei nº. 13.123/2015 foi publicada em 20 de maio
de 2015 sem nenhum veto mas, como resultado da mobilização dos povos indígenas e tradicionais, apontando
como esta lei pode violar seus direitos, houve o reconhecimento público por parte das autoridades no comando
do governo à época sobre a necessidade de garantir a
participação dos detentores dos conhecimentos tradicionais ao menos na fase de regulamentação da norma63.
O Governo Federal apresentou uma agenda específica
para garantir a participação dos povos indígenas, comunidades quilombolas, povos e comunidades tradicionais e demais setores interessados no tema (inclusive
os setores industriais que tiveram ampla participação na
elaboração da nova lei, conforme foi reconhecido pelo
governo e pelas próprias indústrias). Vale destacar que
a referida agenda de trabalho previa expressamente a
apresentação, pelo Governo Federal, de minutas e pro61
MOREIRA, Eliane. A Consulta Prévia e a Nova Lei Brasileira sobre
Acesso e Uso ao Patrimônio Genético da Biodiversidade e Conhecimentos Tradicionais. Centro de Informação da Consulta Prévia.
Disponível em: http://www.consultaprevia.org/#!/columna/22.
62
Um conjunto de 155 organizações da sociedade civil e dos
movimentos sociais solicitou à Presidência da República o veto total do
projeto, por considerar ilegítimo seu conteúdo e procedimento.
63
Mais informações sobre o processo de consulta relativo à regulamentação da Lei de Acesso ao Patrimônio Genético estão disponíveis em:
http://www.socioambiental.org/pt-br/blog/blog-do-ppds/regulamentacao-da-lei-de-acesso-ao-patrimonio-genetico-entre-incognitas-e-criticas.
É importante destacar que a tentativa de realizar um processo de consulta sobre a regulamentação da referida lei
não sana a ausência de consulta prévia durante o processo legislativo, mas significa o reconhecimento, pelo menos por parte do executivo, da existência da obrigação
de consulta sobre a matéria, ao mesmo tempo em que
evidencia a insistência na interpretação errada de que o
direito à CCPLI pode ser exercido mesmo depois de adotadas decisões capazes de afetar os povos interessados.64
Apesar de ser o mais recente caso de ausência de consulta prévia relacionada à medida legislativa, a tramitação da Lei nº. 13.123/2015 está longe de se tratar de um
episódio isolado. Identificamos como particularmente
preocupante a grande quantidade de medidas legislativas que atualmente tramitam pelo Congresso Nacional
e que, apesar de tratarem especificamente sobre direitos coletivos de povos indígenas, comunidades quilombolas, povos e comunidades tradicionais, não preveem
nenhum procedimento de consulta durante o processo
legislativo. Organizações representativas dos referidos
povos vêm solicitando a CCPLI em praticamente a totalidade das iniciativas legislativas em trâmite que os
afetam, sem nenhum retorno ou atenção.
64
Disponível em: http://www.socioambiental.org/pt-br/blog/
blog-do-ppds/o-que-e-o-que-e-sozinha-nao-para-em-pe-mas-acompanhada-pode-ser-um-tiro-no-pe.