Obrigado judicialmente a realizar a consulta por decisão do Superior Tribunal de Justiça105, reafirmada
em sentença da Justiça Federal em primeira instância106, o governo tornou público em diversos momentos que a decisão de construir a hidrelétrica já
está tomada, gerando insatisfação nos Munduruku,
que questionam a utilidade de uma consulta sob
estas condições.
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A reunião realizada entre os Munduruku e o governo (mais especificamente, funcionários da Secretaria
Geral da Presidência da República), em 2 de setembro de 2014, na aldeia Praia do Mangue, município
de Itaituba, Estado do Pará, tinha como objetivo a
pactuação de um plano de consulta e a fixação das
regras que iriam pautar o processo de diálogo entre
o governo federal e o povo Munduruku. Os prazos
que o governo queria impor eram demasiadamente
curtos. As lideranças indígenas afirmaram que seria
inviável uma consulta com prazo tão rígido, sobretudo considerando que o povo Munduruku tem
população de aproximadamente 13 mil pessoas,
distribuídas ao longo de toda a bacia do rio Tapajós,
em mais de 120 aldeias. Explicaram que as decisões
são tomadas coletivamente com participação de todas as aldeias e solicitaram ao governo mais tempo
para participarem de capacitação sobre a Convenção
169/OIT antes do início do processo de consulta. Os
representantes do governo assentiram e se comprometeram a aguardar manifestação dos representantes indígenas para agendar nova reunião. De maneira
surpreendente, alguns dias depois dessa reunião, o
governo publicou a Portaria MME nº 485, de 11 de
setembro de 2014107, agendando o leilão da Usina
Hidrelétrica São Luiz do Tapajós para 15 de dezembro de 2014, contrariando a própria decisão judicial
que exigia consulta prévia. Os Munduruku divulga-
105
Disponível em: http://www.consultaprevia.org/#!/documento/154
106
Disponível em: http://www.consultaprevia.org/#!/documento/541
107
Disponível em: http://www.epe.gov.br/leiloes/Documents/Leil%C3%B5es%202014/Port_485_Diretrizes_Leilao_SaoLuiz_Tapajos_x2x.pdf
ram carta à sociedade brasileira108 onde acusaram o
governo de má fé e de violar a Convenção 169/OIT.109
O governo revogou a Portaria e justificou que a revogação “foi motivada pela necessidade de adequações aos
estudos associados ao tema do componente indígena”.110
Todavia, o governo continuou dando declarações de
que pretendia levar o empreendimento a leilão nos
meses seguintes111 e, no final de 2015, assegurou que
o empreendimento iria a leilão no segundo semestre
de 2016.112 sem que a consulta sequer tivesse iniciado.
Como dito anteriormente, o povo Munduruku ocupa
tradicionalmente diferentes regiões da bacia hidrográfica do rio Tapajós. Estão concentrados principalmente
no alto Tapajós, nas Terras Indígenas Sai Cinza, Munduruku e Kayabi e no médio Tapajós – região onde
está prevista a construção da Usina - em território
denominado pelos indígenas de Daje Kapap Eypi. Essa
108
Disponível em: http://www.xinguvivo.org.br/2014/09/14/leilao-da-usina-de-sao-luiz-do-tapajos-o-governo-mentiu-para-os-munduruku/
109
“Nós Munduruku estamos indignados com o governo. Nos dias 2 e
3 de setembro, guerreiros e guerreiras Munduruku, e outras populações
ameaçadas pelo projeto de construção de usinas no rio Tapajós, tiveram
uma reunião com o governo federal, representado por pessoas da
Advocacia Geral da União, Ministério do Planejamento, Secretaria Geral
da Presidência da República, FUNAI, Ministério da Justiça e Ministério de
Minas e Energia. A reunião foi convocada pelo governo para discutir a
Consulta Prévia, Livre, Informada e Consentida prevista na Convenção
169 da OIT, depois que a Justiça Federal obrigou o governo a cumprir a
Convenção. Os Munduruku explicaram ao governo que estavam preparando uma formação sobre a Convenção 169, porque o assunto é muito
complexo, e que só depois disso vão decidir quando e como será feita
a consulta. Este é o direito que temos, garantido pela Convenção 169,
e o governo se comprometeu de fazer o dialogo com nós de acordo
com OIT e respeitar a nossa decisão no processo de dialogo. Na sexta
feira dia 12 de setembro, ficamos sabendo que o governo publicou no
Diário Oficial da União que fará o leilão da usina de São Luiz do Tapajós
no dia 15 de dezembro deste ano. Ficamos muito bravos com o fato de
a presidente Dilma, o Gilberto Carvalho, o Paulo Maldos, o Nilton Tubino, o Tiago Garcia, representantes de ministérios e outras autoridades
dizer que iam respeitar o direito do povo Munduruku, e depois parece
que este compromisso não vale nada. Agindo assim o governo não
esta cumprindo suas palavras, não está agindo com boa fé e não está
respeitando a Organização Internacional do Trabalho”.
110
Disponível em: http://www.epe.gov.br/leiloes/Paginas/
Leil%C3%A3o%20UHE%20S%C3%A3o%20Luiz%20do%20Tapaj%C3%B3s%20-%20CANCELADO/MMErevogaportaria.aspx
111
Disponível em: http://exame.abril.com.br/economia/noticias/
racionamento-deveria-ter-acontecido-diz-presidente-do-ibama.
112
Disponível em: http://economia.estadao.com.br/noticias/
geral,hidreletrica-do-tapajos-vai-a-leilao-no-2o-semestre-de-2016,1815305