Com a publicação da Portaria, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) anunciou a saída do movimento indígena do processo de diálogo sobre uma possível regulamentação do direito à consulta, alegando a inexistência de boa-fé por parte do Governo que, com tal atitude, se contradizia na defesa dos direitos territoriais indígenas.25 Nesse contexto, APIB exigiu a revogação da Portaria nº. 303 como condição indispensável para retomar a participação nos trabalhos do GTI. Apesar de suspensa, até outubro de 2016, essa Portaria não havia sido revogada ameaçando restringir direitos territoriais mediante interpretação contrária à jurisprudência do STF sobre os alcances do caso da Raposa Serra do Sol. Entre 2013 e 2014, o debate sobre a regulamentação do direito à consulta seguiu sem a participação dos representantes indígenas. Em dezembro de 2014, foi consolidada uma proposta de regulamentação administrativa que se limitava a dispor parâmetros para as comunidades quilombolas. Não se sabe ao certo se ela será publicada ou arquivada. Segundo informações do governo26, a proposta seguiu para avaliação dos Ministros da Secretaria Geral da Presidência da República, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, do Ministério do Desenvolvimento Agrário e do Ministério da Cultura. Disponível em: http://www.consultaprevia.org/#!/documento/166 26 Obtidas através do Serviço de Informação ao Cidadão. 25 A proposta, todavia, vem sendo bastante criticada pelos sujeitos interessados, tanto em termos de processo27 (insuficiente participação e mudança de escopo, sem aviso prévio, das reuniões que eram meramente informativas) quanto de conteúdo (limitação das garantias previstas nos documentos internacionais). As críticas à forma da regulamentação evidenciam que os desafios para implementar o direito à consulta vão além do seu descumprimento. Em muitos casos, são realizadas pretensas consultas, que não observam os padrões internacionais normatizados e resultam em processos que não garantem aos povos interessados autonomia e poder de decisão. Mais do que uma mera regulamentação de direito ou uniformização de procedimentos de consulta entre os órgãos federais e povos interessados, em detrimento das especificidades destes, é necessário que haja um entendimento por parte do Estado brasileiro sobre o espírito e o alcance prático de uma consulta realizada de boa-fé, conforme estabelece a Convenção nº 169/OIT. 27 “Los Estados también tienen la obligación general de consultar a los pueblos indígenas sobre las medidas legislativas que les pueden afectar directamente, particularmente en relación con la reglamentación legal de los procedimientos de consulta. El cumplimiento del deber de consultar a los pueblos indígenas y tribales sobre la definición del marco legislativo e institucional de la consulta previa, es una de las medidas especiales requeridas para promover la participación de los pueblos indígenas en la adopción de las decisiones que les afectan directamente” (ONU – Consejo de Derechos Humanos – Informe del Relator Especial sobre la situación de los derechos humanos y las libertades fundamentales de los indígenas, James Anaya. Doc. ONU A/HRC/12/34, 15 de julio de 2009, par. 67). 15

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