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O Poder Executivo:
decisões não
consultadas
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No âmbito do Poder Executivo, evidencia-se a incongruência entre o reconhecimento formal do
direito à CCPLI e sua garantia efetiva. Se por um
lado foi reconhecido o cabimento da consulta
por diversos órgãos da administração pública, por
outro, há dificuldades em se conceber de forma
integral o conteúdo e alcance do direito à CCLPI.
Encarada como mera formalidade burocrática, a
consulta muitas vezes aparece como um acessório
prescindível em decisões já tomadas. Além disso,
há disputas quanto ao entendimento do alcance
desse direito aos povos e comunidades tradicionais (sujeitos), bem como do alcance dos casos
de exigência também de consentimento (efeitos),
para além dos aspectos que garantam de boa-fé
uma consulta livre, prévia e informada (modo).
Ao longo do estudo abordamos o caso da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte como exemplar dos
vários processos de licenciamento ambiental de empreendimentos de grande porte sem a observância
do direito à CCPLI. Belo Monte não é um caso isolado,
muito pelo contrário, a história parece se repetir em
todos os grandes empreendimentos de infraestrutura
planejados pelo governo federal no âmbito do plano
governamental. Abertura e implementação de novas
estradas e ferrovias, principalmente na região norte do
país, são licenciadas e construídas sem nenhum tipo
de consulta às comunidades indígenas e tradicionais
afetadas, mesmo nos casos em que o projeto é implementado no interior de terra indígena, como é o caso
da construção da Linha de Transmissão Manaus-Boavista na Terra Indígena Waimiri-Atroari.
Audiência da Presidente da República, DilmaI Rousseff,
com representantes indígenas, 2015
Nesse sentido,após sua visita ao Brasil em 2016, a Relatora Especial da ONU sobre os direitos dos povos
indígenas se manifestou: “(…) consultas prévias não
foram conduzidas com os povos indígenas afetados
com relação a mega projetos como a mineração de
ouro Belo Sun no Pará, e a linha de transmissão Manaus-Boa Vista em Roraima. Ela também está preocupada que, com relação às hidrelétricas de Belo Monte e
São Luiz do Tapajós, meras audiências públicas foram
consideradas como suficientes para atender à obrigação de consultar. De um modo geral, inexiste mecanismo adequado de consulta com os povos indígenas com
relação a grandes projetos de desenvolvimento.”145
Ao caso de São Luiz do Tapajós, somam-se outros
exemplos de usinas em construção na mesma bacia hidrográfica sem qualquer consulta aos Munduruku, Apiaká e Kayabi, diretamente afetados pelas Usinas Hidrelétricas de São Manoel, Teles Pires,
Sinop e Colíder. Apesar de o direito à CCLPI ser um
direito fundamental e portanto autoaplicavel, no
Brasil ainda é alegada a ausência de regulamentação nacional como impedimento para seu reconhecimento e aplicação em casos específicos.
145
A/HRC/33/42/Add.1, para. 63