tais sem os necessários diálogos prévios com os
Munduruku. Poucos meses antes, a “Operação Eldorado”, organizada pelo IBAMA e Polícia Federal,
havia culminado na morte de um Munduruku, em
outra demonstração ostensiva de presença militar
naquelas terras indígenas.
Importante mencionar que a Operação Tapajós respaldou-se na alteração das atribuições da
Força Nacional de Segurança Pública, conforme
Decreto nº. 7.957/2013, assinado pela presidente
da República. Por tal medida, foi criada a “Companhia de Operações Ambientais da Força Nacional
de Segurança Pública” que tem como uma de suas
atribuições “prestar auxílio à realização de levantamentos e laudos técnicos sobre impactos ambientais
negativos”.
Em resposta a esse modo inadequado de agir
por parte do governo federal, o povo Munduruku
registrou em seu Protocolo de Consulta que não
aceitará não-índios124 armados nas reuniões (Polícia Militar, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Exército, Força Nacional de Segurança Pública,
Agência Brasileira de Inteligência ou qualquer outra força de segurança pública ou privada)”.
Outro exemplo de descumprimento do requisito
vinculado ao caráter livre da consulta é a forma
como o governo impôs a instrução normativa que
regulamenta o procedimento administrativo para
titulação de terras quilombolas no âmbito do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(Incra), em substituição à normativa anterior, IN
nº. 20/2005125. A suposta consulta foi convocada
como sendo um seminário sobre demarcação de
territórios quilombolas.126 Naquela ocasião, o governo ressaltava constantemente a urgência para
se publicar um novo ato normativo. Assim, emTermo na língua Munduruku que se refere aos não indígenas.
Reuniões que aconteceram entre os dias 15 a 17 de abril de 2008.
126
Para maiores informações, ler ANDRADE, Lúcia. O direito à
consulta livre, prévia e informada: os limites da “consulta aos quilombolas”. Disponível em: http://www.consultaprevia.org/#!/documento/146
placou a necessidade de aprovar nessa mesma
reunião a iniciativa apresentada. Questionado,
atribuiu a urgência à iminência do julgamento
da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 3.239
(discutido no primeiro item deste documento) e
à tramitação do Projeto de Decreto Legislativo nº.
44, que ameaçavam o Decreto nº. 4.887/2003.
Contudo, a urgência imposta pelo governo não se
justificou. A nova instrução normativa foi publicada
apenas em 1º de outubro de 2008, cinco meses após
o evento (Instrução Normativa INCRA nº. 49 de 29 de
setembro de 2008) sendo que na etapa que deveria
ter sido informativa e consultiva, a maior parte dos
participantes conheceu a proposta apenas no dia da
consulta. De acordo com os participantes, não houve qualquer assistência por parte do governo para a
compreensão do conteúdo, apresentado em linguagem predominantemente jurídica e técnica.127
Destaque-se que os quilombolas se posicionaram
pela manutenção da instrução normativa anterior,
mas o governo mostrou-se irredutível. Os quilombolas, então, sugeriram alterações ao conteúdo da
proposta, com o intuito de manter conceitos e direitos conquistados na normativa vigente.
O governo rejeitou as principais propostas sob a alegação de “razões de ordens técnicas”.128 É possível então afirmar que o processo não reuniu as condições
mínimas de uma consulta prévia, livre e informada.
Além disso, o regime de urgência imposto impediu
a participação efetiva e a possível discussão sobre
o procedimento adequado de consulta com as comunidades indígenas de todo o Brasil, diretamente
afetadas com a alteração das regras sobre reconhecimento de territórios quilombolas.
124
125
127
128
Idem, p.6-7
Idem, p.8
43